Coisas de viado ! coisas de bixas !
Para falar sobre a relação entre filmes experimentais e a cultura gay no Brasil, estarei focando este ensaio em poucos filmes. Parece que no Brasil, assim como em muitos outros países, o campo da produção experimental no cinema tem sido desenvolvido por indivíduos que com frequência pensam que estão produzindo alternativas para o cinema comercial. A prática de cinema e/ou de vídeo se tornou um ato de resistência, assim como uma forma de produzir imagens a partir de um espaço, que foi com frequência proíbido, censurado ou nem mesmo concebido. Desde o uso das redes sociais a produção se transformou incorporando outras maneiras de produzir imagens de si. Imagens de rapaiz que nao tenha nehuma representação até que eles produzir as. Seja jovens da periferia, seja trans etc…
Neste sentido, fazer filmes experimentais nos anos 60 e 70 foi uma forma de articular diferentes tipos de prática, dentre as quais foi muito importante a afirmação da subjetividade e do desejo, lado a lado a uma aproximação analítica ao aparato cinematográfico. Quando hoje fazer filmes é coisa muito diferente não so por causa da circulação dirigida a um circuito privado ou aberta ao mundo pelas redes sociais. De qualquer maneira os filmagens se diferenciam dos mais antigos no sentido que se pensam como atos de apresentação de sim, como performança mediatica. O importante é o fazer, no momento e na sua accesibilidade immediate. Entre a captação e a diffusão potencial não tem mais separação. Comentario e apropriação, imitação, parodia d’um evento, de uma novella devem objeitos predilectos da atualidade digital.
Si para entender os filmes dos anos 70 até 90 estava util lembrar-se a importância da produção cinematrográfica feita por cineastas gays e lésbicas na história do cinema experimental, hoje não é mais necessario, as regras dos jogos se ampliaram pela democratização do acesso aos instrumentos de realização. A separação entre os filmes não é so na maneira mas tambem nas generações que produzem as suas imagems. Até os anos 80, a representação dos jovens era ainda controlada pelos pais, quando ficaram filmes de pellicula a divisão patriarcal estava visivel nas senas filmadas. Hoje as crianças, os adolescentes se filmam para fugir do quadro familial. Para mostrar seus mundo a seus pares; é neste sentido que encontramos uma semelhença com a vondade de filmagen de generações anteriores.
E interessante percebir que o uso do celular, para fazer selfie como um filme é uma coisa que se encontra en todos pais do mundo, mas nas periferias é talvez mais forte por causa da ausencia de representação social positiva. Nas periferias a cultura cinematografica não vem do cinema, mais da televisão e da internet; as imagens da perfireria e de seus habitantes sao produzida como uma forma de resistançia as imagems ideologicamente desacrediando- as. . As referencias ampliaram-se. Não se limitem as imagens prodizidas pelas industrias culturals americanas ou europeas mais de outros lugares como da America Latina da Asia ou da Africa. Assim não é mais a uversalidade das referencias que servem de paradigmos mas a existencia de um multidão de referencias particulares, locais. A globalização genera uma perturbação nas maneiras de aprehender o mundo que não pode mais estabelecer-se, representar-se unicamente com as imagens feita pelos brancos. A diversidade se refleta também na idade dos filmadores, que são frequentemente jovens.
Se pensarmos dentro desta história, veremos a importância de Jean Cocteau, Kenneth Anger, Gregory Markopoulos, e Curtis Harrington, em formar a figura do homosexual através do desejo, da ansiedade… A partir dos anos 30 e 40 o homosexual não é somente uma vítima, um fora da lei, um ser menospresado. O personagem do homosexual está a deriva no mundo, se reflete através do filme, que se afirma como uma forma de cinema pessoal, ou mais precisamente como cinema EU. Um cinema que expressa o eu, uma expressão pesoal através da câmera, com frequência mediada por um personagem vivido pelo diretor, seguindo o caminho aberto por Maya Deren com o filme Meshes of the Afternoon em 1943.
Em muitos destes primeiros filmes, a afirmação do desejo é condensada dentro de formas cinematográficas específicas, apesar da subversão da narrativa através do deslocamento, da fragmentação, e da rápida edição. Este cinema está lidando com a ruptura e o êxtase, portanto sua forma é mais livre, e não segue a narrativa canônica. A representação do desejo, sendo algo novo na tela, teve que encontrar novas soluções formais para se manifestar. Os filmes desses cineastas, que fazem parte da geração Americana e Européia que segue, consistem em revelar um sujeito através da busca pela identidade, ou através de um ato autobiográfico, que será compreendido por uma iconografia específica como a do bad boy, ou a do rebelde para Kenneth Anger. Mas a maioria deles, pelo menos até os final dos anos 70, não se posicionará como representante de uma minoria. O que está em jogo é a afirmação do desejo individual e específico. Esse desejo e sexualidade são diferentes e consequentemente questionam o modelo dominante heterosexual, o que não significa que o cineasta representando um grupo. A partir de então, essa minoria pode vir a utilizar múltiplas representações que estão disponíveis e que podem ser compartilhadas/usadas/ e recicladas por seus membros. Nos anos 80 e 90 este fenômeno será importante dentro da comuninade gay Afro-americana, por exemplo, do mesmo modo como o foi para a comunidade lésbica nos anos 70 e 80.
Cineastas como Jean Genet, Sidney Peterson, Donald Richie, Jack Smith, Andy Warhol, Barbara Hammer, Jan Oxenburg, Maria Klonaris and Katerina Thomadaki, entre outros, vão produzir representações de acordo com diferentes estratégias de questionamento, não somente do objeto de desejo, mas também de sua tradução em filme. Para mostrar a intrínseca natureza de seu objeto, os cineastas quebram a linearidade, utilizando-se não somente da edição acelerada (como a de Gregory Markopoulos e Kenneth Anger), ou a maneira incomum de gravar uma cena através do movimento da câmera, da sobreposição, das cenas desfocadas, para transmitir uma sensualidade que o cinema tradicional não transmite.
Reinvindicando uma sexualidade polimórfica e perversa através de figuras andrógenas (Jack Smith, Werner Schroeter), ou enfatizando figuras de inocência infantil como retratadas por Taylor Mead, ou afirmando uma urgência em relação à realização do desejo como no caso de Jean Genet, Kenneth Anger, e Barbara Hammer. A variedade de abordagens é essencial. Elas inscrevem multiplicidade no coração do cinema ecoando a diversidade de desejos e práticas que vão além da reprodução santificada. Desejo, prazer se tornam os aspectos principais para esse tipo de filmes, testando o limite daquilo que é posível filmar e mostrar. Da representação alegórica de atos sexuais à pornografia radical, o leque é bastante grande e tem sido muito bem explorada já há algumas décadas.
Parece existir uma relação próxima entre encenar este mundo invisível e a liberdade que cineastas experimentais desenvolvem em relação ao fazer dos filmes. Uma liberdade explorada de filme à filme, na qual a expressão pessoal e a busca pela identidade são os principais componentes. Se era possível jogar fora os códigos de narrativa, e um cinema de convenções, era portanto também possível apresentar pessoas diferentes. Esta diferença seria vista de forma ultrajante, como ‘Flaming Creatures’, no caso de Jack Smith e o Andy Warhol dos anos 60 e no Brasil, nos anos 70 e 80, com Hélio Oiticica ou Jomard Muniz de Britto. Devemos pensar também a este filme importante de José Agrippino de Paula : Hitler Terceiro Mundo (1969) am qual as representações do homosexual como figura do mal não illustra a homofobia, que trabalhar sobre as nocçoes e cliché do homosexual : talvez pré-queer O tipo de representação que promo José Agrippino ecoa os trabalhos de Ron Rice e da Beat Generação nos aspetos da permissivida e do camp. Aqui a ênfase é no camp, que na cultura gay é celebrado como forma de subversão da codificação do papel masculino, e também como manifestação do obsoleto e da estética ultrapassada e trash. O camp induz outra forma de codificação, uma encenação que muitas vezes será o centro do filme. Para conseguir estes resultados, cineastas irão insistir num aspecto ritualístico como na maquiagem, no figurino e na limpeza. Alguns exemplos podem ser encontrados em Lupe (1966) de José Rodriguez-Soltero, onde Mario Montez improvisou em volta da ascenção e queda de Lupe Velez, e se tornou uma sátira, Flaming Creatures (1963) de Jack Smith , onde o uso do batom provocou alguns momentos visuais interessantes, e My Hustler (1965) de Andy Warhol, onde um garoto de programa loiro realiza diversas atividades, especialmente a cena no banheiro que lembra trabalhos anteriores como Haircut (1963). Estas atividades pareciam levar um longo tempo, ou mais precisamente, elas obedecem à uma expansão do tempo, o que as torna em algo especial. Parece que esta expansão empurra a audiência ao seu limite, tanto quanto a música experimental, como as de La Monte Young e Dream Syndicate. Este tempo expandido induz uma forma de transgressão em relação ao cinema convencional e seu rítmo, em direção a restrição da do narrativo criando um espaço original para figuras singulares que por acaso são gays, travestis, rejeitados… O que é exatamente o que Jack Smith estava fazendo em seus filmes, fotografias e performances, estendendo a duração da avant-scène, procurando entre os detritos a jóia que o filme, a performance, farão brilhar.
Em Agripina é Roma-Manhattan (1972), nós estamos exatamente em uma situação similar. Como Hélio Oiticica afirmou: Há um cineasta que quer me fazer de ator – filmes mudos underground: é Jack Smith, mito do underground americano, estive lá uma vez e ele depois ficou me procurando, até que …
Fui a uma projeção de slides com trilha sonora, uma espécie de quase-cinema, que foi incrível ; Warhol aprende muito com ele, quando começou, e tomou certas coisas que levou a um nível, é claro ; Jack Smith é uma espécie de Artaud do cinema, seria o modo mais objetivo de defini-lo.
Pode-se encontrar nos filmes de Hélio tendências similares como a aceitação da improvisação e uma fascinação por detritos. Em seu filme, Hélio utilizou Mario Montez (aka Dolores Flores, aka René Riveira) para atuar como um tributo a figura cult de Jack Smith.
Mario Montez e Antonio Dias estão vagando pelo centro de Nova York, jogando dados, mas não estão realizando nada. De alguma forma a performance é improdutiva, e neste sentido ela se aproxima da estética de Jack Smith.
O convite de Mario Montez pedia por um mundo underground e criaturas que transgredissem as regras do planeta heterosexual, produzindo novas relações que gentilmente subvertem questões de gêneros, através de uma mistura de clichês, da jovem personagem feminina que parece uma modelo, uma noiva vermelha e um noivo gigolô, etc… Se homosexualismo é concebido, será na margem, como se por acaso. Mas de fato, assim como alguns filmes da vanguarda antecessora, mas de uma forma mais distanciada, o filme de Oiticica está lidando com questões de gênero). Tudo no filme é teatral, cheio de artefatos e glamour barato que demonstra o aspecto do camp, e autoriza essa interpretação. Neste filme, podemos dizer que a vida do homosexual é insinuada, mas não monstrada abertamente. Isso facilita a vida de muitos críticos que se recusam a falar sobre este aspecto de Hélio Oiticica, e portanto não farão a conexão entre este filme com os retratos de rapazes como na série Neyrótika (1973); como se alguém não devesse mencionar este aspecto queen do artista. Esconder este lado pode ser um programa, mas de forma geral nos mostra as dificuldades de uma sociedade em relação as diferenças, e reflete uma forte homofobia. Tudo isso é muito estranho/esquisito!
Com Jomard Muniz de Britto a cena é diferente. Seus filmes feitos em super 8 lidam em parte com assuntos gays, de uma forma mais direta. No começo eles foram feitos com o grupo teatral de Recife: Vivencial Diversiones. Esses filmes compartilham muito com o teatro baseado na improvisação, no happening, e na reciclagem de objetos e personagens, seguindo a estética do lixo, fazendo deles parte do reino estético promulgado por Jack Smith entre outros. De acordo com Sivério Trevisan: “Com Vivencial Diversiones, ser gay era um elemento inflamatório do elemento subversivo.”
Elemento subversivo que pode ser visto nos filmes feitos por Jomard Muniz de Britto de 1974 até o final dos anos 70. O que está em questão aqui não é somente a afirmação da ambiguidade que subverte o papel e sua interpretação dentro dos códigos da sociedade, mas também a afirmação do caráter gay em todos os seus aspectos e variedades. Dois filmes de Jomard Muniz de Britto são exemplares: Vivencial 1 (1974) no qual a troupe questiona o mito do andrógeno, o que é seguido por uma espécie de orgia que acontece na escadaria de uma igreja. A dimensão ritualística, a atmosfera festiva, para não dizer carnavalesca, facilitam a subversão e a transgressão. O uso de símbolos religiosos e gozação dos representantes católicos evocam mais Jean Genet que o anti-catolicismo do surrealismo. Este filme retrata uma sexualidade livre, uma sexualidade fluída, a qual por não se atribuir à um objeto parece ter algumas similaridades com o que promulgou em seus filmes, Jack Smith. Inventário de um feudalismo cultural (1978), mistura elucubrações de um grupo de travestis evocando uma jornada pela história do Recife. As figuras flutuantes dos travestis, e do rapaz são essenciais para este cineasta, tanto quanto foram tão proeminentes para Derek Jarman, ou Lionel Soukaz. Seus filmes parecem seguir uma pessoa só, até encontrar outra, e assim por diante. Oscila-se antes de ir de um para o outro, enquanto o garoto se vai trepando com outro. O que está em questão aqui é uma forma de militância pelo prazer, que significa neste caso, prazer gay e que encontramos em muitos filmes underground Europeus e Americanos das décadas de 60 e 70. Nesta ordem pode-se abranger os filmes de Jomard Muniz de Britto, aos do movimento hippie vistos nos trabalhos de Ron Rice e Saul Levine, que celebram a liberdade do sexo e das drogas.
Se, no mundo ocidental pode-se seguir um desenvolvimento regular dentro da cena de filmes experimentais, uma geração após a outra, parece que no Brasil este não foi exatamente o caso. A produção de filmes parece ter se modificado, como citado por Arlindo Machado entre outros, de filme para vídeo bem cedo, mas conforme minhas pesquisas até este momento falta um pedaço desta história, não que não houvesse uma produção nos anos 80, mas esta era certamente menos prevalente. O vídeo era a forma predominante já que estava mais disponível e de certa forma, mais barato que filmes.
Rafael França foi uma figura dominante dentro da vídeo arte no Brasil, segundo Arlindo Machado ele teve um papel importante na junção entre as artes vísuais e a arte de vídeo, mas ocupou uma posição passageira. Alguns de seus trabalhos lidam diretamente com conteúdos gay, como O Profundo Silêncio das Coisas Mortas (1988) e Prelúdio de uma Morte Anunciada (1991). Se o primeiro lida com amor e traição entre dois amantes, ele é feito de uma forma que mistura passado com presente, memória com realidade. Neste sentido o vídeo está utilizando a possibilidade do deslocamento que a edição oferece nesse meio. O seu vídeo partilha com alguns trabalhos de Gary Hill um interesse por uma estrutura de narrativa elaborada, que não segue uma linearidade tradicional mas que envolve questões sobre a semiótica do aparato. O seu último trabalho lida com a questnao da Aids. Essa fita feita alguns dias antes de sua morte mostra dois corpos se acariciando (ele e seu namorado), enquanto nomes de alguns amigos (18 no total), passam sobre cenas em close das mãos, bocas, e faces dos dois amantes. Abre-se em preto e branco até que o texto sobrepõe-se aos corpos vestidos filmados em cor. Este filme lida com a Aids, e desta forma fala e retoma outros que lidam com o mesmo assunto. Se a propagação da epidemia da Aids foi dramática na comunidade gay, também impulsionou uma mudança no fazer de filmes nos final da década de 80. Primeiramente nos Estados Unidos e na Inglaterra e depois em todos os lugares com a erupção através do ativismo em torno da Aids do novo cinema gay. Para os cineastas e astistas, as questões eram múltiplas, por um lado ele deveria saber como produzir filmes que lutam contra a vitimização da comunidade gay, e por outro lado mostrar que ser gay nessa epidemia não significava a falta de prazer, de sexo. Para alguns cineastas isso significou fazer filmes lidando com questões que não eram abordadas até então, como a etnicidade (os trabalhos de Isaac Julian, Marlon Riggs foram cruciais naquele momento tanto quanto o trabalho de Richard Fung), pornografia transgênicos, etc…
Cineastas e artistas estavam preocupados com tópicos nos quais a questão da comunicação estava em jogo, ou seja, como acessar uma audiência mais expandida, para poder transmitir a mensagem ou a contra-mensagem e produzir alternativas para a mídia dominante hetero. Vídeo e Aids tem sido um campo fértil de produção devido à urgência da crise, e porque a Aids revelou, como ainda faz, uma sociedade feita de desilusão e tabus. Esta fita do Rafael França foi uma das primeiras a lidar com a Aids no Brasil (1991) de uma forma alegórica. Esta, mostra um amante acariciando, beijando, mas você não vê o seu rosto, exceto no final, onde vemos que este personagem é o próprio artista. As estratégias utilizadas neste vídeo são similares, até mesmo similares à trabalhos feitos por diferentes ativistas com o propósito de mostrar que o afeto entre homens existe à despeito da Aids. Neste sentido pode-se ver uma conexão entre o trabalho de Rafael França e teses de Grand Fury, Tom Kalin, Gregg Bordowitz, e John Lindell para citar alguns. Não é a raiva que é dominante, mas o afeto, que é próximo à melancolia e a tristeza. Esta forma de melancolia, que me faz pensar em Saudade, também está presente em diferentes fitas de Cyriaco Lopes, ao qual iremos retornar.
Em Paixão Nacional (1994), Karim Ainouz com seu filme de 16mm sugeriu diferentes questões, lidando com o turismo sexual e com o fato de que para um brasileiro não é muito fácil ser reconhecido como homosexual. De certa forma o filme fala da paixão dominando a razão. O filme mistura diferentes técnicas que se relacionam com a tradição de filmes de diário, mas sabe-se que é uma mera ficção e não um documentário, que mistura duas vozes. Uma é a do extrangeiro fascinado pela sensualidade do Brasil, e a outra é a do brasileiro morrendo pela hipocrisia de seu país. Neste sentido o filme compartilha mais com algumas das questões que o Novo cinema Queer estabeleceu em filmes de Tom Haynes, Gregg Araki, e Rose Troshe…o que será confirmado, pelo seu longa – Madame Satã (2001).
Os dois últimos artistas de que gostaria de comentar brevemente, fazem filmes/ fitas em conjunção com outras práticas visuais. Cyriaco Lopes começou seu trabalho no Rio de Janeiro mas mora nos Estados Unidos já faz nove anos, enquanto Edson Barrus vive entre São Paulo e Paris e começou a fazer vídeos quando morava no Rio de Janeiro no final da década de 90.
Em Beijos de Língua (2005-2006), e em Lovers and Saints (2007) os conteúdos são mais explicitamente gays que em outros trabalhos do artista, mas ao mesmo tempo não são travalhos ativistas. Eles abordam uma temática gay entre outros assuntos. Eles inscrevem, para dizer que não anexam, conteúdo gay. Em Beijos de Língua, as fitas feitas de frases curtas evocam situações peculiares de conteúdo cifrado que pode ser interpretado como camp, como gay, assim como se podia encontrar em muitos filmes de Hollywood quando era proíbido/censurado lidar com certos assuntos. Aqui encontramos uma estratégia similar mas com um toque poético. Nós falamos sobre isto sem sermos muito óbvios, insistentes, gentis e de certa forma bem quietamente. Estamos bem longe da provocação dos anos 60 e 70 onde excesso era essencial. Estamos num tempo onde a homosexualidade é aceita como uma forma de se viver, onde não se briga mais pela diferença… questão de crença. Neste trabalho, os textos são de fato um pretexto para outra história: Traçando a genealogia da lingua portuguesa, demonstra-se como a mistura a constitui. De uma certa forma estas noções de híbridismo são também produtivas em Lovers and Saints, no qual imagens de criminosos, homens mais procurados, são apresentados como amantes e santos. À estética utilizada aqui nos lembra Pierre e Gilles, uma certa paródia kitshy.
Alguns dos trabalhos de Rafael França e Cyriaco Lopes compartilham estratégias estéticas em torno da fragmentação e do uso das palavras como representação, que foram utilizadas por alguns artistas chamados pós-modernos e em filmes e vídeos ativistas em sua maioria; é aqui que encontramos o gay e a Aids, no qual o uso do texto é fator chave para a articulação de diferentes níveis de significado, apesar da velocidade de suas aparições como nos trabalhos de Tom Kalin, John Lindell, ou meus próprios trabalhos. A democratização das ferramentas se manifesta com o uso do computador que da a possibilidade de fazer seu montagem com difrente tipo de sofware sem ajuda externa. Quando Edson Barrus fazia Bate Papo, precisava ter uma câmara externa para registrar o desfilé das telas. Hoje não é mais necessario, podemos capturar direitamente movimento acontecendo na tela. A representação desta autonomia dos ferramentas do computador pode se applicar ao uso de texto e das lettras em alguns trabalhos de Paulo Scharlach. Escrevendo cartas, ou criando um dialogo entre as lettras de canções e as janella do computador : O relógio parou (2014), jogando com diferente ferramento do computador, incorporando seu “glitch” na representação : Inter-rompidou ou Sentirá sua falta (2012) .
As fitas de Edson Barrus que eu quero discutir são trabalhos realizados, mas pouco vistos. Parece que estes trabalhos que lidam principalmente com a reciclagem de imagens gays pornográficas precisam ser feitos, mas não existem para serem promovidos como a maioria dos vídeos do artista. Trabalhar com imagens pornográficas explícitas sempre foi importante para a cena gay. Estes vídeos constituem um tipo de coleção, catalogando um cenário similar de sexo de diferentes filmes. Eles reconhecem a democratização do acesso à pornografia que de certa forma aboliu as fronteiras e está disponível à quase todos em qualquer lugar do mundo em fitas e DVDs. O cinema não é mais o único lugar onde estes filmes são vistos.
Muitos cineastas experimentais influenciaram a produção pornográfica nos final dos anos 60 e começo dos anos 70 nos Estados Unidos, ou por fazerem filmes que beiravam a pornografia (ver os problemas ocorridos nos anos 60 e 70 com Jean Genet, Jack Smith, Kenneth Anger, ou Shuji Terayama e nos anos 80 com Lionel Soukaz e nos anos 2000 Lary Brose) ao empurrar o limte do que era aceito pela sociedade dentro da representação cinematográfica, ou fazendo o que era considerado pornografia do qual Pink Narcissus (1971 James Bidgood) poderia ser um exemplo histórico, ou Sodom (1989) de Luther Price que foi recentemente re-editado para que pudesse ser mostrado com mais abrangência. Nos anos 80 muitos cineastas experimentais pelo mundo inteiro trabalharam com found footage/material filmico encontrado. No entando, parece normal que como um objeto as imagens pornográficas tanto como a mídia, a web não será excluída desta apropriação. Muitos cineastas experimentais gays, têm desde os anos 80, incluído dentro de seus filmes imagens pessoais roubadas de filmes pornográficos, re-filmados da televisão ou piratiados de DVDs. À epidemia da Aids colocou em questão alguns comportamentos sexuais e nota-se que assistir filmes pornô se tornou um hábito compartilhado por todos. Não é mais um comportamento escondido e encoberto.
A inclusão do fórum gay é o objeto do Bate Papo 22cm (2001) no qual a tela é rabiscada e filmada durante uma conversa com algumas pessoas. O uso privado se torna público. À exibição dessa troca questiona a noção mesma do sexo privado e público. O que há de interesse neste vídeo é o fato de que estamos imersos num tempo diferente, ajustando à uma troca na qual somos somente o receptor passivo? Mas este novo campo aberto que Lionel Soukaz explorou com um de seus videos mais recentes: www.webcam (2005) no qual ele evoca a prática do encontro contemporâneo dentro do universo gay através da imagem e da interação que pela web é sempre induzido pela imagem. Isto não é sem lembrar uma das frases ditas por ele ou por Guy Hocquenghem em Race d’Ep (1979) que a foto de um homem jovem será sempre o item mais emocionante. É sempre uma questão de representação e, mais importante, uma questão de como lidar com a representação.
Em outros trabalhos é a reciclagem de imagens pornô, uma forma de apropriação e revisitação de algumas sequências que dão à estas imagens outra dimensão. De fato os filmes que vemos feitos por Edson Barrus são uma re-filmagem, feita com uma camera digital pequena, ouve-se na trilha sonora a respiração do artista dando uma codificação suplementar à imagem. Nós assistimos não somente à um filme pornô, mas somos testemunhas de uma pessoa assistindo e selecionando sequências e escolhendo parte das imagens para se olhar. A conjunção destas temporalidades é estimulante porquê é reflexiva e nos coloca em outra dimensão, incluindo nosso próprio olhar como uma outra camada de codificação. Isso acontece nos filmes Pour homme, Filmex, e Xbook feitos em 2005, ou até em 69 e THEND, os dois de 2006. Muitos filmes tem lidado com imagens similares mas eles eram uma apresentação de coleção, como no caso de alguns de Hundred Videos (1992-96) de Steve Reinke, ou All You Can Eat (1993) de Michael Brynntrup, ou More Intimacy (1999) de Chen Hui Wu. A especificidade de vídeos do artista Brasileiro tem a ver com a inclusão dele, mesmo através do som da respiração e do tremor da camera. Em ambos os casos o corpo do expectador/ cineasta é incluído no processo, e faz parte do que vemos. O uso privativo se torna público. Ele se torna parte do filme que estamos assistindo. Nos não estamos sosinhos! Em Filme X, por exemplo, ouve-se ruídos que não vem dos vídeos, mas da filmagem, e é –se transportado para outra paisagem imaginária, que transforma ou duplica a nossa experiência de voyeur, e isto especialmete porque neste filme existe uma forte ênfase na abstração da imagem devido à camera lenta, foco suave ou closes extremos, borrando formas e cores, algumas vezes padrões opticos moiré transformam os corpos.
Com Videopunhetas, um trabalho em andamento iníciado em 2001, o artista se masturbou em frente ao monitor que esta mostrando uma masturbação precedente. Um trabalho em uníssono! Um pinto encarando sua própria imagem. Todas estas masturbações são feitas para vídeos e evocam trabalhos anteriores feitos por Vito Acconci. Nós podíamos ouvi-lo, mas não vê-lo pois estava escondido embaixo do chão da galeria. Trinta anos se passaram desde a exposição, nós estamos agora encarando o espetáculo da sexualidade que foi realizado para e com a assiatência de novas ferramentas digitais. O que é importante nesta experiência feita por Edson Barrus, a despeito do orgasmo descrito ou não, é o fato de que os filmes foram mostrados numa galeria. O deslocamento do olhar, a locação onde o evento foi mostrado, transformou e colocou em questão este espaço público, que foi invadido por partes íntimas. É um acesso diferente e maior abertura do que os oferecidos pelo papo virtual ou pelos sites como o X-tube, You Porn…, no qual pode-se ver e compartilhar os próprios encontros sexuais ou masturbação com qualquer um procurando a fita.
Parece que com trabalhos deste tipo, o que estava em questão inicialmente para a maioria dos cineastas experimentais que lidam com o cinema pessoal, era fazer imagens que afirmem a identidade do artista, seu desejo tanto como suas imagens foram democratizadas de maneira que qualquer um pudesse fazê-lo. Para a maioria dos cineastas, novas questões em relação à acessibilidade a enorme quantidade de trabalho produzido, vão modificar a investigação voltada ao processo de criação audiovisual.
O que ainda é surpreendente é o fato de que apesar da produção de filmes pela indústria que incluem conteúdos gay, ou até novelas, questões gays parecem com frequência entendidas como de menor importância, e são desenfazidas não somente pelos críticos, mas também pelos próprios autores, como se fossem sempre um trabalho secundário, até que chegaram os celulares que as novas gerações se apropriam para propor seus conteúdo. Assim Leona, vá nos anos 2000 influenciar muitos jovens com seu uso da filmagens sem qualidade. O termo de sem qualidade deve se entender aqui como um filmagem feito, em casa com celular básico. Que importa, não é a qualidade das imagens, que o fazer de qualquer jeito, seu filme. Assim na “novela” Leona A Assassina Vingativa (2009, 2010, 2011) se encontra o desejo de fazer da novela, sua história. Não é mais a novela da Globo, é uma novela em qual os artifícios e os ressaltos se encontram e se fazem com as pessoas do lugar : Belem, com irmão, amigos, no caso da proposta de Leona. A novela é o pretexto para estabelecer retrato das pessoas que não têm acesso usualmente as suas representações. O filme inscreve a possibilidade de jogar com os códigos da novela, como lhe permite de subverter os quebrando as limites do bom gosto, ou de espectador mítico da televisão. Com Leona nos entramos no uso e desvio local das redes nacionais que vão alem da moral estabelecida pela novela, jogando com a polimorfa do desejo homoerotico. E interessante ver que isto é feito para um menor (todos os primeiro capítulos da Leona vingativa), questionando assim as regras importadas a sexualidade pelos códigos morais seja sócias ou religiosos se pensa na Frescá No Círio (2015).
A generalização do “feito em casa” se encontra em muitas propostas que não se preocupam da historia do cinema mais com a vontade de produzir (seus) filmes como desde 2012 o fazem o grupo Surto & Deslumbramento no Recife. O coletivo tem a vontade de afastar-se da produção cinematográfica nacional privilegiando “o artificialismo, o lúdico, a paródia, o deboche, a viadagem, a pinta, o pop e a cultura de massa ». Si o artificialismo, a parodia,o viadagem se encontram em todas propostas de diferente cineastas ou grupo, as referencias na cultura de massa não são sempre igual. Entre Belem, Cabo de Santo Agostinho, e Recife, Teresina, o contexto social, como a realidade racial são diferentes e induzem respostas filmicas diferentes. Assim entre o coletivo do Recife, e os trabalhos de Leona ou de Junior Araujo, se percebe que a idade gera um tipo de filmes onde a afirmação é diferenciada. A necessidade não é a exatamente a mesma por causa da realidade política e ideológica. A importância da afirmação do viadagem é uma questão ideológica que vá ter repercussões múltiplas transformadas cada vez pelas questões raciais, econômicas, da idade e do gênero.
SI pode dizer também que os filmes do Surto é Deslumbramento são mais analítico no sentido que se percebe na distancia e nos roteiros de cada proposta, quando quais da Leona, ou de Junior Araujo com Dixon ( 2016), participam de um abordagem mais espontânea. Nos selfies seja fotográficos ou filmicos a questão é relativa a performance. Como você vá dar conta do momento, e de sua representação ? Este tipo de filmagem se aproximam do film jornal, um cinema subjetivo, onde o cineasta responde aos eventos que são na frente de sua câmara, seja que lhe vá encontrar-os de proposto como fazia, por exemplo Nelson Sullivan nos anos 80 em downtown Nova York, ou por acaso como se faz com os registros de viagem. A mistura das doas tendências caracterizam as produções contemporâneas que oscila entre o selfie, o video clipe, como se vem com Dixon, ou com Eu Quero um Boy (Cover Gaby Amarato) (2014). nesta mistura se encontram as energias e o desejo de fazer filmes como se podia ver com a produção dos irmãos Kuchar que desde no inicio dos anos 60 iniciarem suas careiras com 8mm antes utilizar o 16mm. No filme Dixon, o abordagem do tratamento das imagens mostra uma liberdade em relação aos estilos que não privilegia uma hierárquica estética, e evoca um jogo onde se uso uma multiplicidade de efeitos no tratamento da imagens como as relações entre as diferentes takes. O filme de Junior como alguns de Leona Vingativa usam a estética e o calibragem do video clipe, mais no sentido inverso. Usualmente o clipe ilustra com representações diversas as letras da musica. As imagens constroem a narrativa, quando aqui as imagens entre em uma dinamica próxima da coreografia no sentido que elas interagissem com as letras como um contraponto. Seguindo a maneira de Bruce Conner de unir musica e imagem com seus filme de found footage, o uso contemporâneo do retrato faz conversar de novo os media sem vergonha… uma construção instável, que se transforma a cada filme. Os filme devem um jogo com/de divergência entre a dimensão figura e o som. Neste sentido esses filmes evocam a dualidade modal do cinema histórico em qual a imagem é separado do som. Ao mesmo tempo o uso contemporâneo combina o uso da separação com o Mickey Mousing que significa a duplicação do evento visual com o som. Esta oscilação entre os dois usos estabelecem a instabilidade que é o sinal da contemporanidade, ela não se fixe em uma forma definitiva mais pode virar em qualquer direção, um devir constante.